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segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Poema à moda de Caeiro

Esta tarde,
Guardo o meu rebanho entre paredes.

Olho a chuva que cai lá fora
E rega as árvores do meu campo.
Elas dão-me o fruto do dia-a-dia
E depois morrem,
Tal como deve ser.

Porém, esta tarde,
Guardo o meu rebanho entre paredes.

Olho a chuva que cai lá fora,
Que me impede de sair,
De colher o meu fruto,
De guardar o meu rebanho.

Mas não vou pensar nisso.
Pensar entristece.
Vou antes sentir aquela Natureza
Entre paredes.

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Cesário Verde, o poeta descontextualizado

“Além de ser uma réplica do realismo irónico queirosiano (…) o realismo lírico de Cesário Verde será o seu esforço de autenticidade anti-retoricista, com versos magistrais, salubres e sinceros.”

Perante a realidade do século XIX com que não pactuava, Cesário Verde procurava produzir uma poesia transgressora e reflexiva que criticasse a tradição, os padrões e as normas do seu tempo. Para tal, usufruiu da ironia e abusou das hipérboles, lançando-se recatadamente no modernismo, um período literário futurista relativamente ao século em questão. Combinando percepções de fenómenos físicos e morais diferentes, obtêm-se, por vezes, contradições que demonstram, por isso mesmo, a ironia característica tanto de Cesário como de Eça de Queirós – “Fatné esperava-os, majestosa e obesa…” (Eça); “Um cheiro salutar e honesto a pão no forno.” (Cesário Verde).
O facto de ser acusado de descontextualizado, renovador e reformista devido ao desenquadramento num movimento literário ou, por outro lado, à adopção de todos eles, levou Cesário Verde a tornar-se um autor de referência do século XX. Dentro dos movimentos literários seguidos pelo autor lisboeta, podem destacar-se alguns que tomam um papel mais importante: o realismo (o movimento que reúne mais consenso quando se trata de classificar a poesia de Cesário Verde), onde o poeta, também naturalista, expõe o seu interesse pela captação do real e atenção no mundo exterior e nos seus pormenores e detalhes cruciais - movimentos, luzes, atitudes e cores – deixando-se absorver pelas formas concretas e materiais que o farão descrever quadros e atitudes provenientes da realidade nos seus poemas; o parnasianismo, renovado por volta de 1850, centra-se no ideal ars gratia artis (arte pela arte) que frisa a mera reprodução da realidade directamente observada em formas e cores, sem qualquer tipo de sentimentos e valorizando unicamente a beleza do artesanato do poeta, podendo-se ainda asseverar no âmbito desta corrente literária que Cesário utiliza os temas do quotidiano citadino e campestre por traduzirem o exterior, com uma enorme formalidade através da beleza e musicalidade da sua poesia pelos versos decassilábico e alexandrino, do uso de adjectivos que, embora seja abundante, não deixam de ser ricos e expressivos e assim como a utilização de recursos estilísticos tais como aliterações, imagens, metáforas e sinestesias; o impressionismo (que também “herdou” de Eça para além da ironia), de uma vertente pictórica, revela as suas emoções poéticas que só se expressam após terem sido despoletadas pelo que o exterior em si provocou através da visão, principalmente factores muito importantes e tomados como substantivos e não como adjectivos como por exemplo a cor e a luminosidade.
O “versos magistrais, salubres e sinceros” traduzem a ideia de versos simples, limpos e honestos. A palavra “magistrais” utilizada por Cesário em “O Sentimento dum Ocidental” surge de forma a confessar a importância que o autor dava aos seus poemas, crendo verdadeiramente que estes seriam destacadamente referenciados na literatura no futuro. O poeta tenta fazer passar a ideia de verdade sem elaborar linguisticamente os seus versos, sem lhes aplicar a arte de bem falar tradicional, tomando assim uma posição anti-retoricista. Aliás, Cesário até compôs a sua própria definição de retórica como sendo a visualização, selecção e realce das impressões, alternando e contrastando as suas características. Porém, e embora os seus versos não possuam um estilo rococó, cheio de rodeios, enfeites e floreados, adquirem um carácter difuso, apresentando associações inesperadas entre os elementos frásicos e jogos de palavras que transformam os versos ditos como simples em versos de complexa compreensão.

sábado, 14 de março de 2009

Alexandre Herculano (1810-1877)

Escritor, historiador e jornalista nascido em Lisboa. Influenciado pelo seu amigo Almeida Garrett, Herculano dedicou-se ao romantismo e ofereceu, pela primeira vez, a historicidade à narrativa literária portuguesa. Íntimo com a natureza, era nela que se refugiava não só para escrever as suas narrativas como também os seus poemas.
Eurico, o Presbítero conta a triste história de amor entre Eurico e Hermengarda durante o século VIII na Península Ibérica. Trata-se de um romance histórico, escrito por Alexandre Herculano no ano de 1844, em que predominam a narrativa e a descrição. A religiosidade, o nacionalismo e o patriotismo, o maniqueísmo (confronto entre o Bem e o Mal), o favorecimento do indivíduo ao invés da sociedade e a existência de uma mulher-anjo como personagem são algumas características românticas evidenciadas na obra.

Bernardim Ribeiro

Escritor português cuja vida é uma incógnita - pensa-se que terá nascido por volta do ano de 1475 em Torrão. Introdutor do bucolismo em Portugal. As suas obras medievais desenvolvem-se em volta do amor e da saudade numa linguagem arcaica.
Menina e moça foi escrita por Bernardim Ribeiro e publicada pela primeira vez em 1554, seguindo-lhe mais duas edições. Um romance de cavalaria, pastoril e sentimental, em que é dado destaque à nostalgia e sofrimento provocados pelos desencontros amorosos. O autor encontra uma nova forma de narrativa associada ao feminismo, à saudade e à solidão que inspiraria outras obras estrangeiras.

domingo, 21 de dezembro de 2008

"Não há meias liberdades" de Manuel Alegre

Declaração política na Assembleia da República
29.03.2007

“Senhor Presidente, senhores Deputados
Em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista queria aqui expressar o mais vivo protesto e o nosso repúdio por um cartaz que apareceu hoje no Marquês de Pombal, em nome de um chamado Partido Nacional Renovador, com palavras de ordem de carácter xenófobo e racista, contrárias à Constituição da República, aos valores essenciais da democracia e aos princípios de tolerância que têm pautado a nossa vida democrática.
Além disso isto é um atentado a valores essenciais da nossa cultura. Aqueles que dizem “Portugal aos portugueses” estão a fazer uma afirmação contra Portugal e contra os portugueses. Nós fomos um país de emigrantes, defendemos sempre a integração dos nossos emigrantes nos países onde trabalham, mas hoje somos um país de imigrantes e defendemos uma política de inclusão, que é uma política essencial à consolidação da nossa democracia e ao desenvolvimento do nosso país.
E àqueles que pretendem dar lições de portuguesismo partindo de valores de intolerância e de racismo, quero lembrar o nome de Luís de Camões, que na língua portuguesa escreveu dois dos mais belos poemas de amor anti-racista: um dedicado a uma mulher negra, as "Endechas a Bárbara Cativa", e outro a uma mulher chinesa, o soneto mais célebre da língua portuguesa, “Alma minha gentil que te partiste”.
Um grande europeu, André Malraux, que foi também na sua juventude um anti-fascista, disse que “o racismo é o mal absoluto”, um mal que nós temos de condenar com todas as nossas forças, fazendo respeitar a nossa Constituição, os valores essenciais da nossa democracia e os princípios da tolerância sem os quais não pode haver convivência democrática.”
Em resposta às intervenções de apoio vindas de todas as bancadas, Manuel Alegre afirmou ainda:
“Quero congratular-me com as intervenções que foram feitas por todas as bancadas e também pelo senhor ministro dos Assuntos Parlamentares e verificar que há uma grande sintonia na condenação do conteúdo racista, xenófobo e anti-democrático daquele cartaz.
E queria dizer também que não há meias liberdades. A liberdade ou é ou não é. E quando se ameaça a liberdade de alguns, ameaça-se a liberdade de todos. E quando se defende a exclusão de alguns, defende-se a exclusão da liberdade e a exclusão da democracia.
E por isso nós não podemos fechar os olhos nem podemos tapar os ouvidos. Há um dever de pedagogia política e de pedagogia democrática, que nem sempre tem sido feita. Tem havido uma grande inibição, uma grande timidez e parece que uma grande cerimónia na defesa dos nossos princípios, dos nosso valores e no exercício de uma pedagogia democrática, sobretudo em relação às gerações futuras.
E nós também não podemos ter uma contemporização excessiva com a intolerância, com manifestações de racismo, com a agressão àqueles que escolheram o nosso país para nele viver e para nele trabalhar. Aqui também há uma responsabilidade política dos partidos políticos, daqueles que estão representados nesta Câmara.
Mas também há uma responsabilidade das autoridades públicas. Eu penso que existem as leis suficientes. Existe a Constituição da República, existem os tribunais, existem o Ministério Público e as autoridades públicas. E essas têm também que assumir as suas responsabilidades. Porque aqui há fronteiras que não podem ser ultrapassadas. Como disse o senhor ministro ( e eu concordo perfeitamente com essa célebre frase ): “Não devemos permitir que a serpente germine no ovo”.
Não se trata de responder à intolerância com intolerância. Trata-se de nós sermos firmes e de não termos vergonha nem complexos de defender os nossos valores que são os valores da tolerância, da democracia, dos direitos humanos e da liberdade para todos.”
Manuel Alegre discursa perante os deputados na Assembleia da República sobre o polémico cartaz do PNR. Defende que Portugal é um país tolerante e não seguinte de ideias racistas ou xenófobas. Apresenta diversos argumentos a favor da sua tese: argumentos de autoridade quando faz referência a citação de celebridades (“o racismo é o mal absoluto”; “Não devemos permitir que a serpente germine o ovo.”) e argumentos exemplificadores quando menciona o facto de Portugal ter sido um país de emigrantes e de presentemente ser um país de imigrantes. Dá ainda o exemplo de dois poemas de Camões de modo a realçar os seus argumentos.
Manuel Alegre, o orador, adopta para o seu discurso uma estrutura dedutiva em parte da ideia geral (tese) para a análise dos argumentos escolhidos.
O auditório aderiu incondicionalmente à tese de Manuel Alegre após este ter argumentado, talvez por partilhar desde do início da mesma opinião que ele. Manuel Alegre agradeceu o apoio enfatizando ainda mais o seu discurso com argumentos que visam apelar às emoções do auditório, remetendo muitas vezes para a democracia e para os princípios que sempre foram defendidos por Portugal. O deputado atribui responsabilidades tanto à população como a autoridades públicas de modo a universalizar a tese para que esta seja recebida por todos.
Este discurso argumentativo apresenta alguns recursos estilísticos: invocação (“Senhor Presidente, senhores Deputados”); anáfora (“E quando se ameaça a liberdade de alguns, ameaça-se a liberdade de todos. E quando se defende a exclusão de alguns, defende-se a exclusão da liberdade e a exclusão da democracia.”) e enumeração (“Existe a Constituição da República, existem os tribunais, existem o Ministério Público e as autoridades públicas.”). É de salientar a ausência de figuras estilísticas muito frequentes na argumentação: a interrogação retórica e a exclamação.
Manuel Alegre utiliza uma linguagem natural adaptada ao auditório que quer persuadir, com a finalidade de este compreender eficazmente cada argumento. O tipo de linguagem utilizada influencia a adesão ou não adesão à tese por parte do auditório.

domingo, 14 de dezembro de 2008

Memória ao Conservatório Real

Garrett conta que a história de Frei Luís de Sousa tem a mesma simplicidade que uma fábula trágica antiga. A extrema-unção e a sensibilidade cristãs estão presentes nela “acendendo até nas últimas trevas da morte, a vela da esperança que não se apaga com a vida”.
Afirma que a renuncia de Prometeu cravado de cravos no Cáucaso, os remorsos de Édipo e os terrores de Jocasta não são mais sublimes que as próprias personagens da história Madalena de Vilhena e Manuel de Sousa Coutinho.
Garrett escreveu em prosa, pois não queria outro ritmo que não esse a ser deduzido pela forma harmoniosa e suave de Frei Luís de Sousa. Preferiu-o a “imitar o grande modelo”.
Pela sua forma, a obra de Garrett é um drama; pela sua índole, a obra de Garrett é uma tragédia antiga.
Há muitos anos, Garrett encontrou um teatro ambulante, onde assistiu a uma comédia cujo assunto era “Frei Luís de Sousa”. A princípio, aquela peça não lhe suscitou qualquer emoção, só depois de ler Memória do Sr. Bispo de Viseu, D. Francisco Alexandre Lobo e padre Frei António da Encarnação, se apercebeu da grandiosidade e beleza da peça.
Informa que não se julga obrigado a apresentar a verdade da História.
Garrett oferece a obra ao Conservatório Real de Lisboa, deposita total confiança neste ter sido útil à literatura renascente, reunindo características veneradas pelo escritor.
Salienta que num século democrático como o de então, o que se fizer é pelo e com o povo. O povo sendo povo, quer verdade.
Almeida Garrett despede-se, afirmando que “o real e o necessário da vida” é o trabalho e não o lazer.

sábado, 1 de novembro de 2008

“Clavis Prophetarum”, Padre António Vieira

Entre 1659 e 1665, Padre António Vieira estrutura a que consideraria ser a sua maior obra Clavis Prophetarum (em português “chave dos profetas”): 59 capítulos que responderiam cada um a uma pergunta que Vieira listara nesse intervalo de tempo. Esses 59 capítulos estariam contidos nos planeados 7 livros.
Em 1963 acrescentou ao plano uma obra introdutória Livro Anteprimeiro da História do Futuro.
Para Padre António Vieira, as profecias dos profetas do passado e daqueles que ao longo dos tempos os foram estudando seriam a fonte para descobrir a chave “clavis” para o futuro.
Ambas as obras ficaram bastante incompletas devido às intensas actividades políticas e diplomáticas de Vieira e à acção da Inquisição que atendia sempre às obras escritas por Vieira. Os esboços da obra continham vários textos que iam contra o Dogma Católico.
Existe uma fundamental diferença entre as duas obras: Clavis Prophetarum é dedicada na sua maioria à evangelização futura mundial e a História do Mundo trata essencialmente do futuro de Portugal e da sua transformação do mundo. Seria uma alusão ao “Milagre de Ourique” em que D. Afonso Henriques recebeu um mandado de Deus.